Título do documento Os Desastres da Guerra
Subtítulo (sobre gravuras de Francisco Goya)
Data de Composição · 2021
Os Desastres da Guerra são uma colecção de gravuras habitualmente expostas no Museu do Prado, em Madrid, através das quais o grande pintor espanhol Goya nos leva a visualizar toda a crueza e brutalidade de uma guerra – neste caso, aquela que opôs franceses a espanhóis durante as invasões napoleónicas.
Na História da Pintura, o fenómeno do belicismo é-nos frequentemente apresentado segundo uma óptica de heroicidade ou mesmo de exaltação da guerra: os soldados garbosos que ostentam as armaduras reluzentes e sempre bem oleadas, ou também as armas que trucidam, decepam, estilhaçam, mas que ali resplandecem à luz de um sol generoso... Do mesmo modo, não haverá quem não recorde, até com emoção, a imagem de Napoleão no seu cavalo branco, espada apontada na direcção da vitória!
São imagens que até dá gosto ver... a despeito da presença de um morto aqui e acolá, para dar ambiente...
Goya, nestas terríveis gravuras a que deu o nome de
Desastres da Guerra, não toma partido por franceses nem por espanhóis e mostra-nos essencialmente todo o horror e toda a miséria moral dessa guerra, resumindo tudo a seres humanos – ou o que deles resta – que jazem no pó das valas ensanguentadas, ou apenas a membros decepados que pendem dos galhos de uma árvore, numa imagem geral de horror e de vergonha, seja ela para vencedores ou para vencidos...
A crueza atroz do acto bélico é retratada nessas gravuras de Goya com uma violência que exclui por completo qualquer espécie de exaltação patriótica ou ideológica: são apenas desgraçados e mutilados...
As sonoridades mais cruas de uma banda sinfónica talvez possam, quanto a mim, traduzir por música as sonoridades macabras deste desenrolar de atrocidades, apenas interrompido de quando em quando por farrapos melódicos da
Marselhesa ou eventuais memórias de uma qualquer melodia espanhola...
António Victorino d'Almeida · Casa da Música (20 de Fevereiro de 2022)