1. Os teus olhos
2. Volta
3. Camélias
A partitura de
Fados Geneticamente Modificados (2018) – para quarteto de multipercussão, foi escrita em resposta a uma encomenda do
Drumming – Grupo de Percussão, que me desafiou a criar uma música que estabelecesse uma ligação directa com o fado.
Este é um género com uma linguagem harmónica rudimentar e que, ao contrário de outras expressões musicais de origem popular como o flamenco, por exemplo, não é particularmente elaborado na sua construção rítmica. A sua maior riqueza reside, essencialmente, na ornamentação melódica e na expressão vocal dos cantores. É precisamente desse registo que nascem as maiores surpresas, frequentemente inspiradas em textos que nos relatam desgostos amorosos, sentimentos de tristeza e nostalgia, num contexto de fatalidade.
Escrever para uma formação de quatro percussionistas, sem a presença de uma voz solista, significava, em parte, ficar dependente de outros parâmetros que, para mim, são menos inspiradores no fado. Como tal, procurei abordar alguns aspectos mais simples, não como uma “fatalidade” para a qual a solução residisse num trabalho de enriquecimento da linguagem rítmica e harmónica, mas colocando-os num primeiro plano narrativo e assumindo a sua rudimentaridade como ponto de partida para cada andamento.
Recorri também à manipulação de excertos de antigas gravações disponibilizadas no Arquivo Sonoro do Museu do Fado, modificando a sua estrutura, editando fragmentos, criando loops, e destacando alguns vocábulos ou pequenas frases como “os teus olhos são tão tristes”, “tenho uma luz que me guia”, “volta, que eu já perdoei”, “viver contigo”, entre outras. Maioritariamente, utilizei excertos de
Fado da Luz, cantado por Alexandre Resende (1.º andamento);
Último Pedido, por Berta Cardoso (2.º andamento); e
Camélias, na voz de Corina Freire (3.º andamento). No entanto, no processo de manipulação genética destas fontes, podemos ainda identificar algumas inserções de outros fragmentos com as vozes de Alberto Reis, Emília Rodrigues, Jorge Bastos e Manassés de Lacerda.
© Luís Tinoco, Dezembro 2018