Autor do Texto Pedro Nunes
Título do Poema ou Texto O Tratado da Esfera
Letra TRATADO DA ESFERA
Teórica do Sol
Sol habet tres orbes a se inuicem omniquaque diuisos atque sibi contiguos. Quorum supremus secundum superficiem convexam est mundo concentricus, secundum concavam autem eccentricus. Infimus vero secundum concavam concentricus, sed secundum convexam eccentricus. Tertius autem in horum medio locatus tam secundum superficiem suam convexam quam concavam est mundo eccentricus.
Dicitur autem mundo concentricus orbis, cuis centrum est centrum mundi. Eccentricus vero cuius centrum est aliud a centro mundi.
Duo itaque primis unt eccentrici secundum quid, et vocantur orbes augem solis deferentes. Ad motum enim eorum aux solis variatur. Tertius vero est eccentricus simpliciter et vocatur orbis solem deferens. Ad motum enim eius corpus solare infixum sibi movetur.
Hi tres orbes duo centre tenent. Nam superficies convexa supremi et concava infimi idem centrum habent, quod est mundi centrum. Unde tota sphaera Solis (sicut et alterius cuiuscunque planetae) tota sphaera concentrica mundo dicitur esse. Sed superficies concava supremi atque convexa infimi una cum utrisque superficiebus medii, unum aliud (quod centrum eccentrici dicitur) habent.
Moventur autem orbes deferentes augem solis motibus propriis proportionalibus, ita quod semper strictior pars superioris sit supra latiorem inferioris, et aeque cito circumeunt secundum mutationem motus octave sphaere…Poli tamen huius motus sunt ecliptice octave sphaere. Aux enim eccentrici solem deferentis in superficie eiusdem ecliptice continue revoluitur.
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A esfera do Sol é composta de três céus, os quais são por tal arte situados, que a face de fora deles é concêntrica ao mundo, mas a face de dentro é excêntrica. O mais baixo céu deles é pelo contrário, porque a face de fora que é a convexa é excêntrica, e a côncava que é a de dentro é concêntrica. Mas o terceiro céu jaz entre estes dois, e o seu convexo por todas as partes se achega ao côncavo do mais alto, e o seu côncavo ao convexo do debaixo. E assim fica este céu do meio por ambas as suas faces excêntrico.
Chama-se concêntrico ao mundo aquele céu que tem o mesmo centro que o mundo, e excêntrico cujo centro está fora do mundo.
Portanto os dois primeiros céus, parte são excêntricos e parte concêntricos. E porque com o seu movimento levam o auge do sol, chamam-se diferentes do auge do sol, mas porém o terceiro céu é de todo excêntrico, e porque movendo-se leva consigo o corpo do sol que no mesmo excêntrico está pregado, chama-se por esta razão céu diferente do sol.
Estes três céus têm dois centros, porque a face convexa do mais alto, e a côncava do mais baixo têm um mesmo centro que é o universal do mundo. Pelo qual toda a inteira esfera do sol e bem assim de qualquer outro planeta é concêntrica ao mundo, mas o côncavo do mais alto e convexo do mais baixo juntamente com ambas as faces do céu do meio, têm outro centro que se chama centro do excêntrico.
Os diferentes do auge do sol fazem seus próprios movimentos tão concertados, que sempre a parte mais delgada do céu mais alto anda sobre a mais grossa do céu mais baixo, e ao mesmo tempo fazem suas voltas conforme ao movimento da oitava esfera… E os pólos deste movimento são os pólos da eclíptica da oitava esfera, por quanto o auge do excêntrico que é diferente do sol, na face da mesma eclíptica continuamente se volve.
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Círculo excêntrico, círculo da ponta saída ou do centro desviado, se chama aquele círculo cujo centro é fora do centro do mundo…
O primeiro modo do auge do sol, ou a longura maior que são uma mesma coisa, é o ponto da circunferência do excêntrico que do centro do mundo mais se aparta, este tal ponto nos amostrará a linha direita que sai do centro do mundo. E estendendo-se por ambas as partes passa pelo centro do excêntrico, e esta linha se chama linha do auge.
O contrário do auge ou a longura menor, é o ponto da circunferência do excêntrico que ao centro do mundo mais se achega, e sempre está defronte do auge por diâmetro.
A longura média é um ponto da circunferência do excêntrico que jaz entre o auge e o contrário do auge, o qual conheceremos pela linha que sai do centro do mundo e faz esquadria com a linha do auge. E só os dois pontos há no excêntrico que sejam longuras médias.
A linha do médio movimento do sol é uma linha que sai do centro do mundo até ao Zodíaco e vai equidistante a outra linha que sai do centro do excêntrico e chega ao centro do Sol…
A equação do Sol é o arco do zodíaco que jaz entre as linhas do médio e verdadeiro movimento.
Quando o Sol está no auge ou no contrário do auge não há equação.
A maior equação que pode ser é quando o Sol está nas longuras meias, e nos outros lugares cresce ou mingua segundo for o argumento.
Quando o sol mais perto estiver do auge ou do contrário do auge, tanto a equação será menor, e quanto mais perto das longuras meias tanto maior.
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TRATADO DA ESFERA
Teórica da Lua
Luna habet orbes quatuor et unam sphaerulam, primo enim habet tres orbes (sicut sol) in figuratione dispositos, silicet duos eccentricos secundum quid, qui vocantur orbes augem eccentrici lunae deferentes. Et tertium eccentricum simpliciter, in horum medio locatum, qui deferens epiciclum appellatur. Deinde habet orbem mundo concentricum (aggregatum ex tribus aliis) ambientem, qui deferens caput draconis dicitur. Ultimo habet sphaerulam quae vocatur epiciclus profunditati orbis tertii immersam, in quo quidem epiciclo corpus lunare figitur.
Dicti vero orbes lunae in motu suo talem habent ad solis motum annexionem, ut semper linea medii motus solis sit in medio inter centrum epicicli lunae et augem eccentrici eius, vel simul cum eis, vel in opposito amborum simul existentium, ita quod in omni media solis et lunae coniunctione centrum epicili lunae et linea medii motus solis et aux eccentrici lunae sint in uno puncto zodiaci secundum longitudinem. Quare fit ut in omnibus quadraturis mediis eorum centrum epicicli lunae sit opposito augis eccentrici sui, et in omni oppositione media rursus in auge.
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A esfera da Lua tem em si quatro céus, três deles são como os do sol, convém saber que dois não são de todo excêntricos, os quais se chamam diferentes do auge do excêntrico da lua, e o terceiro céu, o qual jaz entre estes dois, é de todo excêntrico e chama-se diferente do epiciclo. O quarto céu cerca por todas as partes os três sobreditos céus, e chama-se diferente da cabeça do Dragão. Tem mais a mesma esfera da lua uma esfera muito pequena metida no grosso do terceiro céu, a qual se chama Epiciclo, e neste epiciclo está o corpo da lua.
Mas os ditos céus da lua em seu movimento têm tal concerto com o movimento do sol, que ou a linha do médio movimento do sol está entre o centro do epiciclo e o auge do seu excêntrico, ou junto com eles ambos, ou no contrário lugar donde ambos juntos estão. De sorte que em todas as meias conjunções do sol e da lua, o centro do epiciclo e a linha do médio movimento do sol e o auge do excêntrico da lua se acham em um mesmo ponto do zodíaco segundo a longura. E por todas as vezes que o centro do epiciclo se apartar por três signos da linha do médio movimento do sol que é no quarteirão da lua estará no contrário lugar do auge do excêntrico, e quando por seis signos que é na oposição, tornará a estar no auge.
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DE CREPUSCULIS
Proposição III
Exemplo numérico
Observada a altura de uma estrela qualquer, a aresta da medeclina que passa pelo centro, e à qual os Astrónomos chamam linha de fé, tenha no astrolábio a posição do diâmetro fg, corte o quadrante ir, de 87 partes iguais, no ponto o, e o arco da altura oi compreenda 30 partes.
Neste caso multiplicaremos 30 por 90, resultando 2700, dividiremos este número por 87, e da divisão virão 31 graus; restarão porém 3, que multiplicaremos por 60, e resultarão 180, e finalmente dividiremos 180 por 87, divisor constante. A divisão dará 2 primeiros minutos, e o resto será 6, que multiplicaremos a seguir por 60 para alcançarmos os segundos minutos, e ficarão 360; dividiremos estes por 87 e resultarão da divisão 4 segundos minutos, o resto será 12, e multiplicado este por 60 e dividido o produto pelo divisor constante, virão 8 terceiros minutos, e da divisão ficarão 24.
Desta forma iremos até onde se quiser.
Para que este instrumento possa ser utilizado com mais vantagem nas observações do Sol, façam-se mais dois orifícios muitíssimos estreitos nas pínulas; o raio do sol que por eles passar mostrará com maior certeza a altura dele acima do horizonte.
Proposição XIV (determinação de tempo)
Exemplos numéricos
(94850 – 58778) = 36072 * quadrado do seno total = 360720000000000
93849 * 78079 = 732763071
360720000000000 / 732763071 = 49227
Proposição XV (determinar a duração do crepúsculo)
Em Lisboa, decorrendo o ano da salvação de 1541 no primeiro de Outubro, à tarde, estando o céu sereno, observei, do ponto mais alto do castelo da cidade, quando já não havia claridade na banda ocidental, a estrela do Coração do Escorpião, tendendo para o ocaso, e verifiquei que ela se elevava 5 graus acima do horizonte. Dado que a posição desta estrela é o fim do 4º grau de Sagitário, o que concorda com a opinião de Albaténio e ainda outras observações nossas, a sua declinação será 24 graus e 56 minutos e a ascensão recta 241 graus e 10 minutos, pelo que subtrairemos 8715, seno recto de 5 graus, a 44463, seno recto de 26 graus e 24 minutos, altura meridiana da dita estrela, e restará a diferença 35748 dos senos rectos; multiplicaremos esta diferença pelo quadrado do seno total e dividiremos o produto pelo número resultante da multiplicação de 90679, seno recto do complemento da declinação da dita estrela, por 78079, seno recto do complemento da altura do polo e resultarão da divisão 50492, seno verso de 60 graus e 19 minutos, da distância da mesma estrela ao meridiano.
E porque neste tempo o Sol ocupava o fim de 18 graus de Libra, a sua ascensão recta era 196 graus e 35 minutos; consequentemente a diferença das mesmas ascensões rectas foi de 44 graus e 35 minutos, e desta maneira a distância do Sol ao meridiano, no sentido do movimento diurno, foi de 104 graus e 54 minutos, dos quais subtrairemos o arco semi diurno do Sol de 84 minutos e 18 segundos, e restarão 20 graus e 36 minutos para a grandeza do crepúsculo, isto é, 1 hora, 22 minutos e 24 segundos.
Não obstante, se procedermos à averiguação do cálculo rigoroso, este resultado é um pouco maior do que a duração do crepúsculo. Com efeito, o crepúsculo vespertino não começa antes que o centro do Sol desça 14 minutos abaixo do horizonte; convém pois, pela Proposição VIII, calcular o tempo desde o meio dia até que o centro do Sol desça os referidos 14 minutos abaixo do horizonte: em seguida, subtraindo isto à distância encontrada, ficará a verdadeira duração do crepúsculo.
Proposição XVI (dada a duração do crepúsculo deduzir a distância do Sol ao horizonte)
[Em Lisboa, decorrendo o ano da salvação de 1541 no primeiro de Outubro, à tarde, estando o céu sereno, observei,] que a declinação do Sol era de 7 graus e 5 minutos, e o seu complemento de 82 graus e 55 minutos: multiplicaremos 99236, seno recto deste complemento, por 78079, seno recto do complemento da altura do polo; multiplicaremos o produto por 125713, seno verso do arco composto pelos arcos semi diurno e crepusculino, cujo valor é de 104 graus e 54 minutos; e dividiremos este produto pelo quadrado do seno total, isto é, desprezamos os 10 últimos algarismos, e ficarão 97405, a que subtrairemos 69779, seno recto de 44 graus e 15 minutos, altura meridiana do Sol, e ficarão 27626 para o seno recto do arco da depressão do Sol no limite do crepúsculo. A este número correspondem na tábua 16 graus e 2 minutos.
Desta maneira pois, ficou conhecida a grandeza do arco da depressão do Sol no limite do crepúsculo, como nos propusemos investigar.
Proposição XVII
Lista de coordenadas dos exemplos gráficos: bc bcd qa hepc ab...
Observações
Cantado em latim e português sobre textos de Pedro Nunes (séc. XVI)
Em sublinhado estão as partes entoadas. Em itálico estão as partes recitadas.
Por vezes encontram-se as duas situações em simultâneo.
Nota-se também que por vezes foram utilizadas duas versões do mesmo texto: uma em latim e outra em português.
O texto que não se encontra nem sublinhado, nem em itálico figura apenas como tradução do latim ou ainda com o propósito de proporcionar ao leitor uma certa contextualização dos fragmentos efectivamente utilizados na obra.
A ordem de apresentação dos textos corresponde à ordem estabelecida nos livros de Pedro Nunes, mas nem sempre corresponde à ordem da sua apresentação na obra musical.