As quatro partes estão ligadas entre si, obrigadas a manter uma tensão estratégica que não lhes oferece uma estratégia de saída adequada. Conseguir qualquer tipo de vitória não é uma opção, tal como não o é sair da situação. E, no entanto, apesar de estarem ostensivamente contra os outros, qualquer participante que se envolva em agressão garantirá, de facto, a sua própria morte.
Para onde é que vamos a partir daqui? Bem: a lado nenhum, se a metáfora do impasse for credível. O quarteto está preso numa relação de interdependência.
A peça emprega uma espécie de notação quase proporcional. Uma notação mais convencional, seja ela metricamente notada ou disposta de acordo com uma grelha temporal, quase poderia ser recuperada ou intuída a partir da forma como é apresentada - mas não deveria. Esta disposição espacial dá pistas aos actores sobre as proporções temporais dentro de cada um dos seus enunciados, bem como sobre as proporções entre diferentes gestos.
As "manchas" que acompanham as alturas notadas traçam graficamente a pressão do ar soprado para o instrumento ao longo do tempo - por outras palavras, a quantidade de energia a ser introduzida no sistema físico que é o instrumento. Devido à física subjacente de um instrumento de sopro, isto tem a dupla função de representar o nível dinâmico, mas também o brilho ou a complexidade do timbre. Mas o eixo temporal em relação ao qual esta energia é traçada resiste a colapsar numa unidade discreta, permanecendo em vez disso flexível e contínuo, não medido e não mensurável: A durée de Bergson. Isto dá aos atores tempo para negociar a produção de som no contexto de um vocabulário que gradualmente mas seguramente se retira para terrenos de fragilidade a partir de uma posição inicialmente resoluta. Ou, o que é mais interessante, isto permite que o próprio material - o seu desenrolar temporal, a sua dramaturgia, a sua fisicalidade - molde e restrinja o tempo, e não o contrário. Tal como o tempo resistiu a ser dividido em unidades discretas, o material também ripostou.
O desenrolar temporal concreto de cada gesto, no entanto, não é apenas condicionado internamente pelas circunstâncias inerentes à sua produção física (como o nível dinâmico ou a pressão e resistência de um determinado dedilhado multifónico), mas é de facto incessantemente negociado na interação entre as partes. Este tempo maleável - esta durée - que brota do material poderia condenar os atores a um certo tipo de autonomia fechada, sem dúvida na direção do ruído ou do murmúrio inconsequente. Longe disso: as partes são coordenadas por um sistema de pistas sonoras, forçando os actores ao impasse. Os quatro intervenientes estão ligados uns aos outros, obrigados a manter uma tensão estratégica.
A durée única de cada um dos músicos empurra e puxa contra a dos outros, destabilizando ainda mais a relação entre o músico e os sons que ele produz, bem como a relação já de si carregada da camada simbólica com o resultado ouvido. A ausência radical de qualquer tipo de tempo técnico, metronómico - o tipo de pulsação a que se podia bater o pé, como nos quartetos de cordas do passado, salvaguardando uma parte da nossa autonomia - faz com que seja impossível sair da situação. Esta rede de contingências só se desmorona no momento de tocar. Assim, o tempo é verdadeiramente materializado por este ritual transsubjectivo. O tempo para no momento em que se deixa de o produzir ativamente. Simplesmente não existe uma abcissa a priori para seguir o desenrolar virtual da peça.
Tal como acontece com os próprios sons, esta interdependência retira aos jogadores qualquer ilusão inicial de determinação ou autonomia. E, no entanto, esta interdependência que os levou a um estado de fragilidade é a única forma de prosseguirem.
O título é emprestado de um poema da poetisa canadiana Anne Carson (
The Life of Towns, de Plainwater, 1995), e espera-se que mantenha alguma da perigosidade persistente dos seus versos.
Luís Salgueiro