Entidade/Evento Casa da Música | Concerto/Instalação - Música & Revolução
Local Casa da Música
Localidade Porto
País Portugal
Notas Sobre a Obra
CASA DA MÚSICA
CIBERMÚSICA
Erik Satie: Vexations
Filipe Lopes (concepção)
Vexations é Satie. Não há outra forma absoluta de definir uma obra tão excêntrica e enigmática quanto o seu autor. Procurar explicá‑la é sempre um exercício de aproximação à verdade que desagua, invariavelmente, nas idiossincrasias de um homem singular. Escrita para piano, em 1893, Vexations reflecte a originalidade do compositor e pianista francês Erik Satie (1866-1925). Descoberta só em 1949, a partitura resume-se a uma desconcertante página que combina harmonias de natureza familiar, quando apreciadas isoladamente, de um modo incomum. Poderia ser uma miniatura musical de interesse relativo no conjunto da obra de Satie, não fosse a anotação, ambígua, que o próprio deixou no manuscrito: "Para tocar este motivo 840 vezes sucessivas, seria aconselhável preparar-se previamente, no mais profundo silêncio, em séria imobilidade". É impossível descortinar se esta seria uma indicação séria ou uma provocação, típica do compositor tal como é impossível determinar a importância que Satie deu a esta composição e a razão por que a escreveu. Onde há mistério abundam as teorias.
Vexations terá sido composta num período difícil para o autor, causado pelo fim do seu único (e voraz) caso amoroso conhecido. À luz da melancolia, a replicação insistente poderia cumprir o desejo de mitigação do sofrimento ou, antes, de imersão na dor. Mas a obra pode desvendar outro Satie: o músico incompreendido que sabia destilar sarcasmo. Neste caso, a estrutura musical simples e a repetição ostensiva seriam uma resposta cínica (talvez apoiada numa nova estética que reconhece o papel "profundo" do tédio na arte) aos seus detractores - críticos musicais e Conservatório de Paris- e à monotonia da cultura burguesa.
Outras leituras levam a outros traços de uma personalidade complexa, como o misticismo, com a peça a repetir-se como um mantra, meditativo e hipnótico. Não é despiciendo, também, ver aqui a obsessão de alguém com rotinas invioláveis, coleccionador de fatos ou guarda-chuvas idênticos; ou a extravagância de um homem que imaginava paisagens, ordens religiosas e instrumentos musicais intocáveis (mundos inventados que descreveu em milhares de pequenos rectângulos de papel).
Sim, Vexations é Satie. Uma composição desafiadora e intemporal, que tardou a ser divulgada. Só em 1963, em Nova Iorque, se realizou a sua primeira audição completa, numa maratona de mais de 18 horas organizada por John Cage e que envolveu 10 pianistas. Desde então, tem sido interpretada por todo o mundo, revelando um fenómeno que a torna ainda mais intrigante: apesar da sua aparente simplicidade e sucessiva repetição, dificilmente se deixa memorizar - o intérprete não consegue prescindir da partitura; o espectador retém apenas uma ideia vaga do que escutou.
Vexations chega à Casa da Música num registo novo: uma instalação/concerto centrada no Disklavier, programado para tocar ininterruptamente as 840 vezes de um motivo que vai conhecendo variações subtis ao longo da interpretação. Concebida como performance interactiva, em que as qualidades acústicas da sala emprestam nuances indeléveis à obra, esta apresentação presta honra à singularidade de Satie: fazendo justiça aos horários escrupulosos registados em "Memórias de um Amnésico", escrito autobiográfico do compositor, o piano sem pianista começou a tocar às 20h09, nem mais nem menos um segundo, do dia 25 de Abril de 2012.
Circulação
Obra
Tipo
Data
Entidade/Evento
Local
Localidade
País
Intérpretes
Observações
Inv Row
Vexations
Estreia
2012/Apr/25
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